VENTOS QUE EMPURRAM ONDAS: mudança institucional no processo penal contra indígenas
diferença cultural; processo penal; mudança institucional; “índio
aculturado”
A presente pesquisa moveu-se pela seguinte questão: o Estado reflete sobre a diferença
cultural em seus julgamentos criminais? Assumindo o fato de o sistema de justiça
brasileiro julgar criminalmente membros de Povos Indígenas, buscou-se verificar como o
Poder Judiciário lida com o estudo antropológico, previsto na Resolução n. 287/2019 do
Conselho Nacional de Justiça, o qual se volta a promover a tradução e o diálogo
intercultural no processo. Com o mesmo desiderato, analisou-se também como são
aplicados a atenuante e o regime de semiliberdade engastados na Lei n. 6.001/73, cuja
leitura deve ser feita à luz da Constituição de 1988 e da Convenção n. 169/OIT. O exame
das decisões, realizado sob o marco teórico neoinstitucionalista, que permite esmiuçar a
mudança institucional e eventuais fatores que para ela concorrerem, revelou a existência
da instituição informal “índio aculturado/integrado”, bloqueando os efeitos dessas
instituições formais. Durante o trabalho, foram pesquisadas decisões do Supremo Tribunal
Federal, do Superior Tribunal de Justiça, do Tribunal Regional Federal da 5a Região e do
Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco cujo objeto tenha sido a discussão sobre a
aplicação dos direitos em tela, que são normas favoráveis a acusados indígenas. No
intento de verificar se a Resolução n. 287/2019-CNJ foi capaz de alterar as regras do jogo,
no qual prevalece a dita instituição informal, foi feito um cotejo entre o conteúdo das
decisões prolatadas antes e depois da sua publicação, ocorrida em 02 de julho de 2019.
Embora a prática de suprimir direitos invocando a assimilação cultural persista, há
evidências de que a publicação da norma pelo CNJ pode abrir caminho para um processo
de mudança mais profundo, especialmente se os atores interessados nela insistirem em sua
aplicação pelo Poder Judiciário.