Prevalência de anemia e de insegurança alimentar em pré-escolares no contexto da pandemia de COVID-19: um estudo de base populacional.
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A suspensão do ensino presencial em decorrência da necessidade de enfrentamento da pandemia de COVID-19 trouxe como consequência a interrupção do fornecimento das refeições no ambiente escolar. Os pré-escolares e escolares submetidos a precárias condições socioeconômicas foram duplamente prejudicados, pois não puderam contar com a merenda escolar com regularidade, ao mesmo tempo em que ficaram expostos à escassez de alimentos em seus domicílios. Neste contexto, decidiu-se estimar a prevalência de anemia de pré-escolares matriculados em Centros Municipais de Educação Infantil (CMEIs) de Maceió-AL, caracterizar a sua gravidade a partir das concentrações de hemoglobina, contextualizar a anemia no panorama da segurança alimentar das famílias e identificar outros fatores associados à anemia nesse estrato populacional. Trata-se de um estudo transversal com uma amostra aleatória selecionada por conglomerado envolvendo 243 crianças de 24 a 59 meses, matriculadas em período integral em CMEIs do município de Maceió-AL. Foram avaliadas as concentrações de hemoglobina, aferidos o peso e a estatura corporal, caracterizado o perfil socioeconômico-demográfico e de saúde, além do consumo alimentar. A prevalência de anemia foi de 37,6% (IC95% 31,7-43,8), classificada como um problema de saúde pública moderado, de acordo com os critérios da Organização Mundial de Saúde. Tomando-se como base as concentrações de hemoglobina, 83,5% (IC95% 74,9-90,0) das crianças foram classificadas com anemia leve [Hb 9,00 g/dL a <11,00 g/dL], 15,4% (IC95% 9,1-23,8) com anemia moderada [Hb7,00 g/dL a < 9,00 g/dL] e 1,1% (IC95% 0,1-5,0) com anemia grave [Hb<7,00 g/dL]. A insegurança alimentar atingiu 90% (IC95% 86,1-93,9) da população estudada, sendo 63,3% (IC95% 55,9-69,2) de insegurança leve, 23,3% (IC 95% 17,8-29,5) de insegurança moderada e 13,5% (IC95% 9,00-18,5) de insegurança grave. Observou-se que 34,9% (IC95% 28,8-41,0) das crianças apresentavam excesso de peso (somatório de risco de sobrepeso, sobrepeso e obesidade); desse total, 34,1% (IC95% 23,9-44,4) apresentavam anemia. O consumo de alimentos ultraprocessados atingiu 77,4% (IC95%72,1-82,8) (somatório da frequência diária e semanal). O estudo concluiu que os pré-escolares matriculados em CMEIs de Maceió-AL em tempo integral, afastados das atividades escolares por aproximadamente dois anos, em virtude da pandemia de COVID-19, apresentam uma dramática situação de vulnerabilidade social, agravada principalmente pelos fatores econômicos que comprometem diretamente a qualidade da alimentação, ocasionando efeitos deletérios importantes, tanto no status nutricional de ferro, quanto no energético-proteico nesse grupo populacional. O retorno integral das aulas presenciais com a consequente retomada da distribuição da merenda escolar pode mitigar a carência nutricional dessas crianças, amenizando um pouco a fome instituída pelo empobrecimento da população brasileira.