JUDITH BUTLER E OS USOS DO DIREITO
Judith Butler; direito; poder; ética; política
A presente tese investiga e estrutura os usos do direito na obra de Judith Butler desde o final da década de 1980 até os escritos mais recentes, analisando como a filósofa articula a norma jurídica em diálogo com ética, política e poder. O problema de pesquisa central indaga qual o papel desempenhado pelo direito e pelos direitos humanos ao longo da trajetória da autora. A pesquisa parte do reconhecimento de que Butler, embora não tenha o direito como objeto privilegiado, oferece formulações valiosas para compreender tanto sua função de sujeição quanto suas possibilidades críticas. Para responder a essa questão, o trabalho mobiliza a leitura de textos de diferentes períodos da produção butleriana, cotejando-os com debates contemporâneos. No Capítulo 1, analisam-se os escritos da década de 1990, em especial Discurso de ódio, para evidenciar o direito como instrumento estreitamente ligado às ambivalências do poder, em diálogo com Michel Foucault. No Capítulo 2, cotejam-se os textos posteriores ao 11 de setembro, nos quais o direito passa a ser pensado como meio de garantir condições mínimas de sobrevivência a populações vulnerabilizadas, em articulação com a filosofia da alteridade de Emmanuel Levinas. O Capítulo 3 aborda os anos 2010, em que Butler aproxima-se de Hannah Arendt e passa a considerar o direito em sua dimensão transformadora, como possibilidade de inaugurar novos espaços políticos e de sustentar práticas de contestação coletiva. Em apêndice ao capítulo, são discutidos escritos mais recentes, da década de 2020, marcados pelo recurso mais incisivo à gramática jurídica frente ao avanço de regimes autoritários. O Capítulo 4, por sua vez, discute à luz da teoria butleriana decisões do Supremo Tribunal Federal no contexto recente de crise democrática no Brasil, especialmente deliberações ligadas a ataques institucionais, milícias digitais e regulação de plataformas digitais, buscando avaliar se medidas adotadas pela corte consolidam o direito como instrumento de proteção das vidas precarizadas e da democracia ou se, ao contrário, reforçam dinâmicas autoritárias. A pesquisa adota metodologia de caráter teórico-bibliográfico, aliando a análise sistemática da obra de Butler a interlocuções com autores como Foucault, Levinas e Arendt, além de diálogos com a produção acadêmica nacional e debate de questões sociais brasileiras com a teoria discutida. Como resultados parciais, evidencia-se a ambivalência constitutiva da relação de Butler com o direito: ora pensado como dispositivo de poder que reforça hierarquias, ora como espaço precário de garantias, ora como horizonte de transformação democrática. A tese pretende contribuir para o debate contemporâneo ao mostrar como a teoria butleriana pode iluminar impasses jurídicos e políticos brasileiros, especialmente diante das ameaças autoritárias e da luta pela igualdade de vidas precarizadas.