ENTRE-LAÇOS QUE EDUCAM E O CUIDADO DE SI: TRAMAS DISCURSIVAS DE IDENTIDADES “DESVIANTES” E MODOS DE SUBJETIVAÇÃO
Educação. Escola. Dispositivos. Lesbianidades. Subjetivação.
Nesta pesquisa, nos propusemos a compreender as implicações dos dispositivos de sexualidade e pedagógicos na constituição de identidades e modos de subjetivação lésbicos. Para isso, nos voltamos a compreender a atuação (e possíveis entrelaçamentos) da família, igreja/religião e escola em processos regulatórios de generificação e sexualização nas narrativas das trajetórias de vida de mulheres lésbicas. Buscamos investigar os processos em que se instituem resistências aos padrões compulsórios de gênero e sexualidade, que irrompem através desses dispositivos; analisamos os processos em que as mulheres tecem a si mesmas, lésbicas, na relação consigo mesmas e com outras pessoas através das experiências vividas na escola (e para além dela). Partimos da interlocução com mulheres que se autodeclaram lésbicas e que viveram suas trajetórias escolares entre os anos de 1980 a 2017. Metodologicamente, realizamos entrevistas narrativas com doze mulheres lésbicas de diferentes faixas etárias através de um roteiro semiestruturado de temas/perguntas. Estabelecemos para escolha das interlocutoras, os seguintes critérios: a) se autodeclararem lésbicas; b) terem estudado a maior parte do período de sua trajetória escolar em escolas públicas em Pernambuco; c) terem cursado, no mínimo, até o ensino fundamental completo. Operamos com um arranjo teórico-metodológico que contempla referências vinculadas ao Pensamento lesbofeminista, aos estudos feministas - de viés pós-estruturalista – e estudos foucaultianos. Construímos, portanto, um desenho analítico em que as narrativas da pesquisadora e as narrativas das entrevistadas se entrelaçam, tecendo uma análise do discurso que se apoia em pressupostos foucaultianos, em diálogo com as teorizações lesbofeministas de Adrienne Rich, Audre Lorde, Glória Anzaldúa e das feministas pós-estruturalistas Judith Butler, Tânia Navarro Swain, Denise Portinari, entre outras autoras. No conjunto dessas análises, foi notória a prevalência de uma atuação conjugada entre os dispositivos de sexualidade e pedagógicos, fazendo instaurar um padrão compulsório de gênero/feminilidade e um regime heteronormativo. Todavia, esse modus operandi não quer dizer que essas forças se movimentaram, impreterivelmente, numa mesma direção, como se estivessem orquestradas e agissem em uníssono. Pelo contrário, através desses dispositivos se configuraram poderes/regimes de verdade que ora se aproximaram, ora se distanciaram, ora se confrontaram, ora se apoiaram entre si. Estes poderes e deslocamentos, abriram margens, fendas, a partir das quais desencadearam-se processos identitários, modos de subjetivação lésbicos tramados enquanto “desvios”, enquanto cuidado de si. Práticas que abrangeram diversas e singulares maneiras de transformarem a si mesmas através das experiências vividas na escola e para além dela, fazendo de suas vidas obras detentoras de sentido, estética, estilo.