"PORQUE HOMEM É HOMEM, NÃO É?": CONSTRUÇÕES E DESCONSTRUÇÕES DA(S) MASCULINIDADE(S) NAS PORNOCHANCHADAS DURANTE A DITADURA CIVIL-MILITAR
Cinema. Censura. Ditadura Civil-Militar. Masculinidades. Pornochanchadas. Pornô-Político.
Esta tese investiga as construções e desconstruções das representações masculinas presentes nos discursos veiculados nas pornochanchadas – filmes eróticos, (geralmente) de apelo humorístico, baixo orçamento e grande retorno financeiro, voltados ao público masculino, produzidos durante as últimas décadas da ditadura civil-militar brasileira (décadas de 1970 e 1980). A narrativa foca, primeiramente na construção dos comportamentos e expectativas que atravessam a masculinidade no ocidente desde a modernidade à contemporaneidade, visando dar bases para a compreensão da presença ou ausência de determinados traços pertinentes ao ―ser homem‖ no contexto analisado. Para tal, utiliza-se o pensamento de Daniel Welzer-Lang, Michel Foucault, Pierre Bourdieu, Pedro Paulo Oliveira, Elizabeth Badinter e outros. Além deste aspecto, a narrativa aborda também a construção do espaço denominado Boca do Lixo, a saber, o centro irradiador da produção cinematográfica nacional no período analisado. Objetivando compreender a trajetória histórica deste espaço, suas disputas de poder, bem como quais estratégias e táticas moveram os atores envolvidos na construção do mesmo como uma região de baixo meretrício, jogos de azar e outros delitos, até a instalação de um polo cinematográfico cujo foco das produções tampouco deixou de explorar estas mesmas atividades já tão arraigadas ao cotidiano da região. Partindo-se desta temática, indaga-se também quais teriam sido as posturas do regime ditatorial frente à persistência da exploração de comportamentos moralmente avessos ao que pregavam os discursos oficiais. Pensa-se a ditadura, suas instituições e agentes, especialmente os da Censura Federal, de maneira não uníssona e heterogênea, composta por sujeitos distintos e disputas internas nos mais variados campos. Acerca da trajetória das pornochanchadas e da Boca do Lixo, faz-se valer dos escritos de Nuno César Abreu, Sidney Chalhoub, Hiroito Joanides, Alfredo Sternheim, entre outros. Acerca da Censura Federal e seus meandros, notadamente concernentes à Divisão de Censura de Diversões Públicas - DCPD, para tal, utilizou-se dos estudos de Carlos Fico, Beatriz Kushnir, Marcília Gama da Silva, Creuza Berg e Jean-Claude Bernadet, por exemplo. Após tratar da censura e seus mecanismos, a análise segue para as produções cinematográficas elencadas para conformar o principal elemento do corpus documental desta tese. Num primeiro momento, são analisadas as obras de David Cardoso e Cláudio Cunha, dois produtores/diretores deste circuito que alcançaram grandes bilheterias e cuja produção repercutiu fortemente no discurso de expectadores comuns e de especialistas. Cunha e Cardoso foram aqui eleitos para representar o que de mais recorrente se viu no gênero denominado como Pornochanchada. Na contramão destes cineastas, destacou-se a breve obra de Tereza Trautman e seu filme Os Homens Que Tive; e dedicou-se em seguida uma especial atenção à obra de Carlos Reichenbach, cujas características autorais e intelectuais o distinguem da maioria dos cineastas daquele momento. O pornô-político de ambos é mote para uma última e mais detalhada análise de como ser homem durante o regime ditatorial não se restringia à masculinidade hegemônica anteriormente destacada.