Desde a publicação de "Luta por Reconhecimento" por Axel Honneth em 1992, abriu-se um vasto campo de debates, que se estendem por questões intelectuais e prático-políticas. Esses debates foram impulsionados pelo contexto histórico de diversos conflitos sociais, que levaram Honneth e outros teóricos da tradição crítica a reavaliar o diagnóstico social, especialmente em termos das dinâmicas de dominação e as possibilidades emancipatórias que emergem dessas lutas. Partindo do legado da teoria crítica, Honneth procurou identificar as inconsistências teórico-normativas dessas dinâmicas sociais e as lacunas emancipatórias que poderiam ser exploradas. Ele seguiu, a seu modo, a exigência emancipatória formulada por Max Horkheimer em "Teoria Tradicional e Teoria Crítica", ao buscar uma reinterpretação do conceito hegeliano de reconhecimento dentro de uma concepção intersubjetiva do conflito social. Honneth, ao destacar os déficits de reconhecimento, estabeleceu uma gramática filosófica para analisar a motivação dos sujeitos que lutam por vínculos sociais mais justos e livres. Ele elaborou um método ex negativo de diagnóstico social, fundamentado na constatação de promessas normativas não cumpridas – como o reconhecimento e a liberdade – que, devido a bloqueios patológicos, não foram realizadas. A partir dessas lacunas, Honneth buscou reconstruir os potenciais de liberdade e reconhecimento, caracterizando o sofrimento social como um sofrimento de indeterminação. Judith Butler, por outro lado, critica Honneth por não aprofundar sua análise nas normas subjacentes que estruturam as relações de reconhecimento e liberdade. Para Butler, o diagnóstico de Honneth se limita a um revisionismo das normas, sem questionar suficientemente suas bases normativas, o que resulta em um sofrimento que ela caracteriza como um sofrimento de determinação. A partir desse confronto teórico, este trabalho buscará explorar o potencial crítico do conceito de sofrimento de indeterminação, ampliando-o além dos limites apontados por Butler. Para isso, será tomada a depressão como exemplo de um sintoma psicopatológico do sofrimento social, revelando que as normas sociais contemporâneas, apesar de sua violência opressiva, paradoxalmente geram uma experiência prática de indeterminação. Essa abordagem permitirá discutir como a sociedade neoliberal transforma a dominação em uma forma de indeterminação, fazendo com que os sujeitos, embora aparentemente livres de determinações, continuem a sofrer sob condições de opressão. A depressão, nesse sentido, emerge como o reflexo psicopatológico desse processo. Para cumprir essa tarefa, o trabalho abordará três pontos principais: (I) expor o desenvolvimento histórico e teórico da teoria crítica, com foco em seu imperativo teórico-político de emancipação; (II) examinar as formulações de Axel Honneth e seu método ex negativo, especialmente o conceito de sofrimento de indeterminação, confrontando-o com as críticas fundamentais de Judith Butler, que propõe uma abordagem mais radical, centrada no sofrimento de determinação; e (III) analisar a experiência depressiva como um exemplo paradigmático de sofrimento por indeterminação, apontando como, em sociedades neoliberais, as relações de dominação são traduzidas em formas de indeterminação, mascarando a violência normativa subjacente. Assim, este trabalho visa contribuir para uma crítica mais profunda das condições sociais que geram sofrimento psíquico, oferecendo novas perspectivas sobre as possibilidades de emancipação em contextos de opressão difusa.