Extirpar demonios, colonizar almas: Demonologia e Conquista espiritual no Peru Colonial (Seculos XVI e XVII)
colonialidade do sagrado; Demonologia; demonolatria; Taki Onqoy;
Extirpação de Idolatrias.
A presente dissertação parte da observação de que ao longo dos processos de Conquista e Colonização da América a Demonologia encontrava-se em plena ascensão no plano ocidental e de que esta foi uma das vertentes teológicas que atravessou os religiosos atuantes no Peru Colonial, constituindo, pois, o paradigma de apreensão das práticas culturais e religiosas andinas bem como o marco sobre o qual foram erguidas as campanhas de Extirpação de Idolatrias nele desenvolvidas. Isso posto, analisamos a configuração do discurso demonológico tecido sobre os territórios andinos entre os séculos XVI e XVII, situando-o junto ao panorama maior da demonização da América Colonial (Cañizares-Esguerra, 2008, 2018; Mello e Souza, 1993). Metodologicamente, debruçamo-nos sobre um corpus de caráter documental composto por um conjunto de registros produzidos por religiosos (cronistas e extirpadores) atuantes no Vice-Reino peruano no período supracitado, quais sejam: Cristóbal de Molina, Cristóbal de Albornoz, Pablo José de Arriaga e Pedro de Villagómez e que foram analisados à luz de investigações majoritariamente advindas da História Sócio-Cultural, da Antropologia Cultural e do Pensamento Decolonial. Ao longo do trabalho discorremos acerca das distintas formas de representação do Novo Mundo, bem como da percepção do Mal no imaginário ocidental; discutimos o papel do discurso demonológico europeu junto às representações do Taki Onqoy e do seu papel junto à emergência das campanhas de Extirpação de Idolatrias levadas a cabo no Peru Colonial; situamos as narrativas elencadas junto à constituição da imagem da América diabólica tecida desde o século XVI e descrevemos como e sob quais circunstâncias, aos olhos dos religiosos, o diabólico persistia sobre os territórios andinos. Respaldam nossas discussões contribuições de investigadores/as como Jean Delumeau, Laura de Mello e Souza, Jorge Cañizares-Esguerra, Nicholas Griffiths,
Iris Gareis, Irene Silverblatt, Pierre Duviols, Claudia Brosseder, Ana Raquel Martins Portugal, Márcio Pimentel Rocha, Flávia Ribeiro Amaro, Enrique Dussel, Aníbal Quijano e Walter Mignolo. Grosso modo, os principais resultados alcançados evidenciam que o discurso heterológico-demonológico de Molina e Albornoz sobre o Taki Onqoy constituiu-se através da transposição e da (re)formulação, no contexto andino, de quatro categorias demonológicas do aparato simbólico ocidental, a saber: a demonolatria, a superstição, a feitiçaria e a bruxaria, as quais evidenciam-se nas narrativas analisadas, serviram de base à lógica extirpadora e respaldaram a imposição da colonialidade do sagrado nos territórios andinos.