OS PRIMEIROS LIVROS DE UMA BIBLIA POS-MODERNA: CAIM, DE SARAMAGO, E O EVANGELHO DE BARRABAS, DE TORERO E PIMENTA
BÍBLIA; CAIM; BARRABÁS; PÓS-MODERNO.
Esta tese, situada no campo da literatura comparada, parte de uma investigação iniciada na graduação e aprofundada no mestrado, dedicada às ressignificações de personagens bíblicos marginalizados na literatura contemporânea de língua portuguesa. A pesquisa concentra-se nas figuras de Caim e Barrabás, protagonistas de Caim (2009), de José Saramago, e O Evangelho de Barrabás (2010), de José Roberto Torero e Marcus Aurelius Pimenta. Ambos os romances, por meio da paródia, da ironia e do grotesco, revisitam e subvertem narrativas fundacionais da tradição judaico-cristã, deslocando Deus e Cristo do centro da cena para instaurar a voz dos execrados. A hipótese aqui sustentada é a de que essas obras, ao tensionarem os textos sagrados com as estratégias da estética pós-moderna, ensaiam a composição de uma nova bíblia — herética — para o sujeito contemporâneo. Nesse contexto, questiona-se se a função da escritura pós-moderna seria, senão a de preencher as lacunas do sujeito em crise, ao menos a de compreendê-las. A base teórica do estudo articula a poética pós-moderna e seu impulso revisionista, a reflexão crítica sobre o mito como forma de organização da experiência humana, os estudos sobre o texto bíblico como construção literária e as estratégias narrativas que desestabilizam os discursos religiosos tradicionais. Por fim, propõe-se uma leitura dos romances como formas narrativas que confrontam a autoridade do sagrado, instaurando uma nova possibilidade de escritura — profana, insurgente e, muitas vezes, caótica — à altura das incertezas do nosso tempo.