#SOMOSTODOSNANDO: “responsibilidade” na charge continuada digital
Análise Dialógica do Discurso; responsabilidade; responsividade; liberdade de expressão artística; chargeada.
Este estudo analisa charges produzidas na mobilização digital de chargistas em apoio ao artista Nando Motta, acerca do processo aberto pelo dono das lojas Havan, Luciano Hang, em dezembro de 2021. O motivo da denúncia foi a publicação pelo artista de uma charge em que o empresário era retratado como uma espécie de monstro, devido às suas ações diante do tratamento de saúde e da morte da mãe, Regina Hang, por COVID-19. Em defesa, os chargistas decidiram reproduzir a charge censurada ressignificando-a. Anteriormente, já havia ocorrido um movimento semelhante, com a denúncia de Renato Aroeirapelo ex-ministro da Justiça André Mendonça em virtude da publicação da charge desse artista Crime Continuado, em junho de 2020. Tal obra deu origem ao nome Charge Continuada, que passou a designar, no ano seguinte, os enunciados de protesto contra a censura produzidos pelos chargistas solidários a Nando Motta. A questão norteadora da pesquisa indaga como a charge continuada, do movimento virtual #somostodosnando, ao constituir-se numa réplica que concorda com a charge censurada, manifesta simultaneamente a responsabilidade de seus autores pela representação negativa do empresário Luciano Hang. Nesses termos, objetivamos examinar a responsividade e a responsabilidade na produção de charges continuadas digitais do movimento #somostodosnando, buscando entender como ambas, sob o querer dizer específico do autor, reforçam a qualificação de Hang como monstro. Sendo assim, propomos como objetivos específicos: i) apontar a ressignificação da charge continuada face à relativa estabilidade genérica da charge; ii) explicitar o projeto enunciativo constituinte da charge continuada; iii) verificar a partir de que movimentos tecnolinguageiros a charge continuada assinalou a resistência dos produtores ao silenciamento de sua arte e, ao mesmo tempo, o fortalecimento do trabalho dos chargistas. A pesquisa se baseia nos pressupostos da teoria dialógica da linguagem – especificamente nos estudos de Bakhtin (1997; 2002; 2010; 2020), Volóchinov (2014; 2021) e Medviédev (2012) – e nas contribuições da Análise do Discurso Digital, de Paveau (2021). Adotamos a metodologia de pesquisa qualitativa, quanto à finalidade descritiva e, quanto aos procedimentos de coleta de dados, bibliográfica e documental (Gil, 2008). O corpus é composto por 6 charges continuadas publicadas no intervalo de 20 a 29 de dezembro de 2021, na página de Instagram @somostodosnando. A análise do corpus demonstrou que a responsividade foi vista na manutenção de personagens do universo do terror e na avaliação de Luciano Hang como monstro. Já a responsabilidade ocorreu pela reelaboração desse sentido negativo sobre Hang, repercutindo na inclusão, no plano verbal, do tópico da censura dirigida a Nando Motta e, no plano visual, na seleção e na representação distintas das personagens do terror a que Hang se sobressaía na charge silenciada.