"A MEGERA ESQUELÉTICA":
UMA HISTÓRIA DA LUTA CONTRA A TUBERCULOSE EM JOÃO PESSOA-PB (1909 – 1946)
História das Doenças; História da Tuberculose; Saúde Pública; João Pessoa; Paraíba.
Esta tese analisa o processo de constituição de discursos médicos e políticas públicas no enfrentamento à tuberculose na cidade de João Pessoa, outrora, Parahyba do Norte, entre 1909 e 1946. Nesse ínterim, a tuberculose se configurou como a doença infectocontagiosa que causou mais óbitos na cidade. O argumento que comprovo ao longo da tese é o de que o combate à tuberculose em João Pessoa visou intervir no corpo social para transformá-lo, almejando, por um lado, imiscuir-se no espaço urbano, especialmente, nas habitações tidas como insalubres para dotar a cidade e os casebres de palha da população de aspectos higiênicos e, por outro, agir profilaticamente no intuito de educar os sentidos e os hábitos dos seus habitantes para tentar conter a disseminação do bacilo. Os discursos e práticas médicas incidiam, ao mesmo tempo, sobre o corpo individual, são ou doente, e sobre o corpo social, a população, tendo como objetivo intervir sobre esses corpos agindo com efeitos regulamentadores sobre o coletivo de seres humanos e seus processos biológicos de saúde e doença. A luta contra a tuberculose em João Pessoa foi caracterizada pelo que classifiquei em quatro fases. A primeira, de regularização, iniciou-se com a criação do Serviço de Estatística Demógrafo-Sanitária, em 1909, cujos dados referentes aos óbitos provocados pela tuberculose contribuíram para formular a compreensão da doença como um problema de saúde pública. No entanto, a ausência de políticas para o seu enfrentamento somente foi sanada durante a segunda fase, identificada como de institucionalização, mediante a criação do Serviço de Profilaxia da Tuberculose e a instalação do primeiro dispensário, em 1923, que se estendeu até a instalação do segundo dispensário, em 1934, assinalando a efetivação do modelo de assistência dispensarial. A terceira fase, que qualifiquei como de consolidação, estendeu-se de 1934 a 1943 e demarcou o recrudescimento da mobilização da classe médica paraibana em torno da luta contra a tuberculose por meio da realização da Semana da Tuberculose, em 1937, que culminou na organização da Liga Paraibana Contra a Tuberculose e na implantação da vacinação pelo BCG. Por fim, a quarta fase, denominada de hospitalização, iniciou-se em 1943 a partir do acordo firmado com o Serviço Nacional da Tuberculose, mediante o qual o governo federal subvencionou a construção do Hospital Clementino Fraga, em 1946, o primeiro nosocômio destinado aos tuberculosos, reverberando pelas décadas seguintes. As implicações dessa fase impuseram uma mudança na própria compreensão da doença, pois compreendo que o processo de hospitalização da tuberculose em João Pessoa concomitante ao alvorecer da terapêutica antibiótica, implica uma ruptura no modelo de combate à doença que passa a se basear em outra racionalidade médica, justificando-se dessa forma a baliza temporal que delimita o recorte cronológico desta tese e abrindo-se, de igual modo, a possibilidade para investigações posteriores.