O Consumo de produtos derivados de Animais Silvestres – uma investigação transformativa
Superstição. Animais Silvestres. Pesquisa Transformativa do Consumidor. Cultura de Consumo. Consumo Pro-Ambiental.
A pesquisa teve como objetivo compreender o que leva indivíduos na atualidade ao consumo de derivados de animais silvestres no contexto cultural brasileiro. Com isso, parte-se do pressuposto de que o consumo de fauna silvestre ultrapassa o domínio utilitário ou econômico, configurando-se como prática cultural e simbólica, sustentada por crenças, tradições e valores transmitidos entre gerações. Fundamentada na Teoria da Cultura de Consumo (Consumer Culture Theory – CCT) e na Pesquisa Transformativa do Consumidor (Transformative Consumer Research – TCR), a investigação buscou interpretar os significados culturais e supersticiosos associados a esse tipo de consumo, bem como propor caminhos transformadores orientados ao bem-estar humano, alimentar e ambiental. A pesquisa adota abordagem qualitativa e interpretativista, desenvolvida por meio de entrevistas episódicas com consumidores de alguma forma consomem animais silvestres ou de seus derivados, complementadas por registros fotográficos analisados com base na Análise Temática e na Análise Semiótica da Imagem. Essa triangulação metodológica permitiu captar tanto as narrativas quanto as representações simbólicas que estruturam o fenômeno investigado. Os resultados revelam que o consumo de animais silvestres e/ou derivados de animais silvestres é sustentado por um sistema simbólico complexo que articula dimensões de identidade, memória, tradição e fé. Seis categorias principais emergiram das análises: tempo de consumo, superstição, motivações, consumo, práticas de consumo e impactos e representações. As narrativas demonstram que o consumo está frequentemente vinculado a significados de proteção espiritual, cura, fortalecimento e sorte, indicando a persistência de crenças supersticiosas e rituais que conferem valor simbólico a partes de animais. Além disso, a prática é também legitimada por fatores culturais e afetivos, como herança familiar, pertencimento territorial e valorização da tradição. A investigação mostra que, embora o consumo de fauna silvestre seja amplamente proibido pela legislação ambiental brasileira, ele permanece enraizado em práticas sociais que expressam identidades culturais e modos de vida. Essa constatação indica que políticas públicas de conservação devem considerar os contextos simbólicos e históricos dessas comunidades, a fim de promover transformações sustentáveis sem deslegitimar seus referenciais culturais. Do ponto de vista teórico, o estudo amplia o escopo da CCT ao evidenciar como crenças supersticiosas e estruturas culturais moldam práticas de consumo não convencionais, e contribui para a TCR ao propor intervenções transformativas voltadas à conscientização ambiental e à educação culturalmente sensível. As proposições apresentadas visam estimular o consumo pró-ambiental, fortalecer o diálogo entre cultura e sustentabilidade e promover a preservação da biodiversidade brasileira. Assim, esta Tese contribui para o campo da Administração e do Comportamento do Consumidor ao articular as dimensões do consumo de animais silvestres com uma abordagem transformadora e ética, propondo reflexões sobre as possibilidades de reconciliação entre práticas culturais tradicionais e a conservação da vida silvestre no Brasil.