OS PROCESSOS DE IDENTIFICAÇÃO NAS TRAMAS DO REAL, DO SIMBÓLICO E DO IMAGINÁRIO: brasileiros em condição de imigração em Buenos Aires
Análise do discurso; imigração; processos de identificação; formações imaginárias; mecanismos discursivos.
Neste trabalho, inscrito teoricamente na Análise do Discurso francesa, propomos analisar os processos de identificação dos sujeitos brasileiros em condição de imigração em Buenos Aires, a partir de sua inscrição na ordem da língua estrangeira e na ordem de um espaço outro, observando como isso se mostra em seus discursos. Partimos do pressuposto de que a imigração constitui um movimento que vai além de um deslocamento físico e que implica um processo de transformação nos modos de se relacionar com os outros, com o espaço, com a língua, mexendo na constituição subjetiva daquele que imigra. Assim, procurando observar as condições de produção específicas dessa imigração, desenvolvemos, em um primeiro momento, um percurso sobre a imigração na Argentina e elaboramos uma descrição das especificidades próprias da imigração brasileira em Buenos Aires, no intuito de oferecer um panorama abrangente como marco de interpretação dos dizeres dos imigrantes brasileiros, que são afetados por essa historicidade. Em diálogo com a psicanálise, refletimos sobre a articulação entre a identificação e as dimensões do real, do simbólico e do imaginário na constituição do sujeito da linguagem e na produção de sentidos. Sugerimos abordar os processos de identificação atentando principalmente para a forma em que ditos processos se mostram na língua quando esse sujeito do entremeio que é o imigrante se diz a si mesmo, ao outro e a seu espaço, afetado pelo jogo das formações imaginárias. Nosso corpus está composto por sequências discursivas obtidas a partir de entrevistas em profundidade realizadas a imigrantes brasileiros em Buenos Aires. Nessas sequências procuramos olhar para o funcionamento de diversos mecanismos discursivos, entendidos como marcas na materialidade da língua que mostram pontos de tensões, estranhamento, adesões e contradições em relação com determinados objetos de identificação construídos no discurso e que neste trabalho agrupamos em dois eixos: o da identificação com o outro e o da identificação com a cidade. No primeiro eixo, destacamos principalmente o funcionamento da comparação, a universalização e a polarização como mecanismos que produzem como efeito o fortalecimento das divisões e o aprofundamento da distância entre brasileiros e argentinos, obstaculizando os processos de identificação com o outro. No segundo eixo, as análises realizadas nos permitiram compreender que as representações de Buenos Aires materializadas nos discursos dos imigrantes produzem um efeito de unidade não contraditória da cidade e estão sustentadas em processos de exotização e abstração. A interpretação dos diversos mecanismos discursivos nos levou a observar as contradições entre a projeção imaginaria de um espaço construído como um terreno de possibilidades, saturado, discursivamente estabilizado e o real de uma cidade que não preenche a falta, que expõe o sujeito a situações de exclusão e que exibe o lacunar entre a cidade desejada e a cidade vivida.