Geografia política do Rio Jaguaribe: A colonialidade da natureza e a formação territorial do Ceará
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Os limites territoriais entre os Estados nos sertões do que hoje conhecemos como Nordeste, cindidos por marcações muitas vezes sinalizadas por rios ou elevações de relevos, foram resultados de intensas guerras com os povos originários e locais de encontro das entradas advindas das duas expoentes aglomerações econômicas-urbanas coloniais ancoradas no litoral. Fronteiras-matrizes, marcadas por guerras contínuas ao longo dos séculos XVI e XVII, como a região do São Francisco, para onde fugiram indígenas de distintos troncos étnicos advindos em retirada desde o recôncavo baiano ou fugidos das imediações que desenham a tríplice fronteira dos atuais sertões de Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Norte. Nesse aspecto entrar continente à dentro é produzir fronteira. Como as entradas da colonialidade vieram pelos mares no início do século XVI, provocando intensos conflitos com os caetés, potiguaras, tupinambás, entre outras etnias; as bocas abertas dos rios murmuraram os caminhos de entradas já traçadas pelos povos originários até as suas fontes, fazendo com que fossem ouvidos na planície fluvio-marinha as vozes dos platôs sertão à dentro. Se é verdade que a lógica moderna da colonialidade, que pariu o capitalismo, só consegue existir em perpétua expansão por ser hierárquica, desigual e excludente, os rios foram para a Coroa do século XVI em diante o que o mar foi desde o século XIV, o perigoso e sinuoso caminho de entrada para a redução, extermínio e subjugação de todas as relações à lógica ocidental em germinação. A colonialidade subjugou a força e o fluxo dos rios a uma lógica de produção de fronteiras, dos maiores para os menores cursos, em movimentos diversos de avanços e recuos. Controlar o acesso ao São Francisco, por exemplo, fundando vilas, exterminando ou catequizando etnias, foi fundamental para em seguida acessar e controlar suas fontes no além São Francisco, oeste da Bahia e instituir fronteiras. Ademais, as batalhas que culminaram em extermínios entre os Rio Jaguaribe e Apodi foram por um lado fundamentais para espalhar mercês, sesmarias e vilas de índios pelo rio Salgado, instrumentalizar os usos das águas nas suas fontes na Chapada do Araripe, bem como decisivas para consolidar ocupação na porção norte da referida Chapada, onde se encontram olhos d’água do São Francisco. Por outro lado, foram fundamentais para marcar a Chapada do Apodi como trânsito de entrada por excelência do gado, local que é divisor de águas dos dois referidos rios. As guerras pelos cursos maiores dos rios irradiaram caminhos de domínio territorial para todos os lados de onde advêm seus afluentes.