“PRECISAMOS FALAR SOBRE DEPRESSÃO”: relatos autobiográficos sobre o sofrimento no YouTube
Depressão. Relatos autobiográficos. YouTube. Discurso.
A presente tese investigou os relatos autobiográficos sobre a depressão publicados no YouTube, analisando a circulação discursiva e os tensionamentos que esses relatos promovem em relação aos saberes consolidados sobre saúde mental, com ênfase nos discursos médico-científicos. Ancorada nos estudos de Michel Foucault (2009 [1971], 2017 [1984]) e em referenciais teóricos contemporâneos, a pesquisa posiciona esses relatos como práticas discursivas que extrapolam a esfera individual, participando da produção coletiva de sentidos sobre o sofrimento psíquico na contemporaneidade. O YouTube, enquanto espaço de enunciação, foi examinado como um ambiente em que sujeitos compartilham experiências pessoais, dialogam com saberes científicos e culturais, e ressignificam suas trajetórias de vida. A tese explorou a relação entre os relatos autobiográficos e a plataformização, destacando como os algoritmos moldam a visibilidade e a circulação desses conteúdos, promovendo interações específicas entre narrativas pessoais e dinâmicas de engajamento. A partir disso, o trabalho analisou como o sofrimento psíquico é transformado em um produto de consumo cultural, enquanto oferece novas possibilidades de subjetivação e construção identitária. O corpus da pesquisa foi composto de relatos em vídeo
sobre a depressão, selecionados com base em critérios de relevância e popularidade determinados pelo próprio funcionamento do YouTube. A análise discursiva revelou que esses relatos operam em várias camadas: como formas de visibilizam o sofrimento, como instrumentos de subjetivação e como narrativas pedagógicas que informam e educam o público sobre a depressão. Eles também se estruturam em narrativas de superação e resiliência, frequentemente alinhados a saberes médicos, mas também permeados por imperativos neoliberais, como a produtividade. A tese destacou o papel central da plataformização e como o YouTube funciona segundo a lógica de engajamento, que interfere diretamente na representação da depressão incentivando narrativas que conciliam o público e o privado. Entre os principais resultados, a tese apontou que os relatos analisados têm um papel ambivalente: por um lado, funcionam como práticas discursivas que ajudam a desmistificar a depressão, por outro, reforçam padrões culturais que podem superficializar e espetacularizar as experiências de sofrimento psíquico. Esse contexto ressalta as tensões éticas e políticas que atravessam o campo da saúde mental nas plataformas digitais.