Corpo abjeto e feminino monstruoso nas visualidades: representações desviantes como vias para desestabilização dos femininos normativos
Visualidades, Gênero, Corpo Feminino
O presente estudo se orienta à produção dos discursos visuais acerca do feminino comprometidos com a expansão das experiências das mulheres e com a diminuição das opressões, explorações e desigualdades que incidem violentamente sobre suas existências, aspectos ainda mais evidentes na atual situação de crise mundial. Partindo-se da importância das narrativas visuais para a transformação da realidade em favor do equilíbrio socioambiental e simbólico no sentido da equidade de direitos entre homens e mulheres, cujos contornos reveladores da grande vulnerabilidade a que estão submetidas pode ser claramente visualizados em relatório recentes da condição das mulheres divulgado no final de março de 2020 pela ONU, o estudo visa apontar caminhos que possibilitem a produção de visualidades que incluam as existências e múltiplas experiências de gênero, e que atuem na desconstrução da matriz sexista opressora em que se baseiam as representações recorrentes do feminino. O pensamento sobre feminino e masculino como construções que ultrapassam a diferença sexual, segundo Teresa de LAURETIS (1994), já era emergente nos escritos feministas da década de 1980. Desenvolvida a partir da teoria de Foucault, segundo a qual a sexualidade é uma “tecnologia sexual”, essa visão propõe que o gênero, como constituição dos sujeitos femininos e masculinos, é também produto e processo “de diferentes tecnologias sociais, como o cinema, por exemplo, e de discursos, epistemologias e práticas críticas institucionalizadas, bem como das práticas da vida cotidiana” (1994, p. 208). LAURETIS (1994) parte da visão foucaultiana que entende o gênero não como uma propriedade dos corpos, mas sim como efeito da linguagem sobre eles, mas ela também faz uma crítica ao androcentrismo das teorias que, buscando combater a tecnologia que produz a sexualidade, não levam em consideração as relações sociais que constituem e validam a opressão sexual das mulheres, permanecendo dentro de uma ideologia que beneficia os sujeitos masculinos (1994, p. 223). Para a autora, a relação entre homens e mulheres é também uma relação de classes, não no sentido marxista, que vê classes sociais como grupos de pessoas unidas por determinantes e interesses sociais relacionados à propriedade ou não dos meios de produção, mas sim as classes como categorias previamente estabelecidas. Masculino e feminino são as representações não dos indivíduos, mas sim de uma relação social, e é aí que se encontra, para a autora, o conceito de gênero. O sexo biológico, então, determina a classe à qual pertence o indivíduo, enquanto o gênero prepara esse indivíduo para que ele assuma uma posição determinada. Masculino e feminino são, nesse sentido, definidos culturalmente a partir da oposição de dois sexos biológicos, o que é denominado como “sistema de sexo-gênero”.