“GOSTARIA DE DORMIR NO INVERNO COMO DURMO NO VERAO”: CORPOGRAFIAS URBANAS GERADAS A PARTIR DA VULNERABILIDADE SOCIOAMBIENTAL VIVIDA PELAS POPULACOES DA BACIA DO RIO TEJIPIO NO MUNICIPIO DO RECIFE
Corpografia Urbana; Vulnerabilidade Socioambiental; Desigualdade Socioespacial; Agentes sociais.
A vulnerabilidade socioambiental é uma das marcas mais expressivas no que corresponde à dimensão da realidade socioespacial da Bacia do Rio Tejipió, presente em porção significativa do território da Região Metropolitana do Recife, no estado de Pernambuco. Essa marca é intensamente sentida pela população local, principalmente quando ocorrem os eventos de inundação, um fenômeno recorrente e responsável pela quebra da rotina comunitária em sucessivas ocasiões. Esse fato contribui para que haja uma relação conflituosa com o espaço, repercutindo nas esferas da habitabilidade e sociabilidade atribuídas à localidade. Diante disso, a pesquisa teve como objetivo analisar as corpografias urbanas geradas a partir da vulnerabilidade socioambiental vivida pelas populações da Bacia do Rio Tejipió, localizadas no trecho que corresponde à Cidade do Recife, precisamente nas comunidades de Sapo Nú, Coqueiral, Jardim Uchôa e Ipsep. O caminho escolhido buscou investigar os principais comportamentos desenvolvidos por quem é afetado pelo calendário anual de inundações. Sobre isso, conforme abordagem realizada por Jacques (2008), a corpografia urbana se apresenta como uma cartografia gerada no e pelo corpo, provocando uma memória urbana inscrita através da experiência vivida na cidade. Para dar embasamento a esta discussão, foram levadas em conta as causas estruturais e sistêmicas que apontam para esta observância, considerando, como trilha de análise, a relação estabelecida entre cidade, desigualdade e vulnerabilidade socioambiental. Em seguida, foi discutida a relação que o corpo desenvolve com o espaço, considerando a abordagem sugerida pela corpografia urbana. Através dela, foram levantadas a corpografia de sofrimento e a corpografia de resistência, leituras distintas e coimplicadas pela dialética exercida através das experiências vividas na localidade. Por fim, a abordagem deteve-se a problematizar a naturalização do risco, identificada pela perpetuação do cenário de desastre, apontado como uma agenda já consolidada localmente. Através desse percurso, e com os dados coletados nas entrevistas realizadas em campo, foi possível confirmar algumas das premissas que apontam para o papel preponderante dos sujeitos no que corresponde ao quadro de vulnerabilidade socioambiental que vivem. Pôde-se ver o quanto há uma relação visceral entre corpo e espaço, manifestada através das práticas desempenhadas na região. Foi posto que essa ligação atinge múltiplas camadas da dimensão socioespacial, repercutida na forma como se dá a ação corpórea, apontamentos que levam a concluir que determinados comportamentos não são ontológicos, mas socialmente produzidos pela desigualdade espacializada na produção capitalista do espaço.