Impactos econômico, social e biológico do turismo de observação de peixe-boi marinho no nordeste do Brasil
Ecoturismo. Turismo de Base Comunitária. Mapeamento. Legislação. Sirênios. Comportamento. Vocalização.
Esta tese tem como objetivo investigar o turismo de observação do ameaçado peixe-boi marinho (Trichechus manatus manatus) no Brasil. No primeiro capítulo nós focamos no mapeamento da atividade de observação de peixe-boi no país, identificando os hotspots, analisando a potencial sazonalidade desta prática, e avaliando as interações não supervisionadas entre pessoas e peixes-boi. Nós utilizamos uma rede social como fonte de dados de interações não supervisionadas entre pessoas e peixe-boi. Detectamos a observação de peixe-boi marinhoem 91 localidades, 19 municípios, e nove estados do Norte e Nordeste do Brasil. Seis localidades foram consideradas com hotspots. Encontramos até 23 pessoas em uma única foto relacionada ao peixe-boi, porém, até cinco pessoas apareceram na maioria das postagens. Constatamos a sazonalidade da atividade, onde a maioria das imagens foram postadas nos meses de verão. Detectamos que as interações entre turistas e peixes-boi permitidas por lei foram significativamente mais frequentes, mas a ocorrência de interações proibidas revela a atual falta de cumprimento das Regulamentações brasileiras quando não há supervisão da atividade. Sugerimos que as estratégias de gestão do turismo priorizem as áreas de hotspots, com foco no reforço do cumprimento das regulamentações e, preferencialmente, envolvendo as comunidades locais. O segundo capítulo teve como objetivo avaliar os níveis de cumprimento do código de conduta por parte dos operadores do Turismo de Base Comunitária (TBC) que levam visitantes ao recinto de aclimatação do peixe-boi marinho, no rio Tatuamunha, no estado de Alagoas. Investigamos também os níveis de maré e períodos do dia mais usados para a realização da atividade. Os comportamentos dos guias turísticos foram monitorados através de observação direta. Encontramos um alto nível de conformidade com o código de conduta, onde foram respeitados o número máximo de jangadas por dia e o número de turistas por dia ficou abaixo da capacidade máxima permitida na maioria dos dias. Também foram respeitados os horários para a realização das atividades. A duração dos passeios ficou acima do limite estabelecido. Os condutores respeitaram o tempo máximo de perseguição do peixe-boi na maioria desses eventos. Não foram observados eventos em que mais de uma jangada se aproximou do recinto de aclimatação ao mesmo tempo e a maioria das jangadas não se aproximou do mesmo peixe-boi ao mesmo tempo. Nós não detectamos comportamentos de molestamento. A maioria dos passeios ocorreu durante os níveis de maré alta e baixa e houve maior incidência de passeios entre os horários 10h-11h e 11h-12h. Nós recomendamos um diálogo junto às partes realizadoras da atividade sobre a importância do respeito ao tempo máximo de observação do peixe-boi. No terceiro capítulo nosso objetivo foi comparar as taxas de comportamentos posturais e vocalizações de peixes-boi cativos e de vida livre, antes, durante e após as visitas das jangadas do TBC de observação de peixe-boi marinho no rio Tatuamunha. Também investigamos se as taxas dos comportamentos posturais variaram entre os indivíduos na presença das jangadas. Os comportamentos dos animais foram monitorados através de observação direta e as gravações foram realizadas com o uso de um gravador passivo. A taxa do comportamento “descanso” foi maior na presença das jangadas, com os testes detectando a diferença entre os períodos antes e durante as visitas das jangadas. A taxa de “alimentação” também variou sendo relativamente maior durante a presença das jangadas, porém, não foi possível detectar que períodos de fato diferiram entre si. As taxas de “natação” e “respiração” não apresentaram diferenças significativas. Os comportamentos alimentação e natação variaram entre os indivíduos na presença das jangadas, enquanto descanso e respiração não variaram. As taxas de vocalizações não diferiram quando comparamos antes, durante e depois das passagens das jangadas. Recomendamos o monitoramento periódico do comportamento desses animais. Em geral, os resultados dessa tese mostram que o turismo desordenado acarreta descumprimento das Regulamentações brasileiras, e que o Turismo de Base Comunitária possui um elevado potencial para a conservação ambiental e proteção das espécies. Porém, baixos níveis de impactos afetam o comportamento postural dos animais, ressaltando a importância de estudos para acessar consequências a longo prazo dessas atividades na saúde e bem-estar do peixe-boi marinho.