RISCO PARA TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA EM CRIANÇAS EXPOSTAS AO VÍRUS ZIKA NA GESTAÇÃO COMPARADAS COM CRIANÇAS NÃO EXPOSTAS
Desenvolvimento infantl. Síndrome da Zika Congênita. Transtorno do Espectro Autista.
A Síndrome da Zika Congênita (SZC) foi descrita entre os anos de 2015 e 2016, após uma epidemia de microcefalia na região Nordeste do Brasil. Diversos estudos já demonstraram a associação da infecção congênita pelo Vírus Zika (ZIKV) com diversas alterações do neurodesenvolvimento, principalmente em crianças com microcefalia. Entretanto o desenvolvimento neuropsicomotor de crianças cujas mães tiveram infecção pré-natal, mas que que as crianças nasceram com SZC, ainda estão em acompanhamento e suas possíveis manifestações em médio e longo prazo ainda precisam ser esclarecidas, para além da microcefalia. O objetivo desse estudo foi verificar a associação entre o risco para o Transtorno do Espectro Autista (TEA) em crianças na idade escolar, nascidas sem a SZC, de mães infectadas pelo vírus da Zika no período gestacional, comparando com aquelas nascidas de mães não infectadas na gestação. Trata-se de um estudo transversal, aninhado a duas coortes: a coorte Pediátrica do Grupo de Pesquisa da Epidemia da Microcefalia (MERG-PC) e a International Prospective Observational Cohort Study of Zika in Infants and Pregnancy (ZIP Study), composta por crianças nascidas no pico e no declínio da epidemia de microcefalia relacionada ao ZIKV, no nordeste do Brasil. As crianças participantes deste estudo foram avaliadas no período entre 2022 e 2024, sendo incluídas aquelas residentes na região metropolitana do Recife ou até 120 km da cidade. A Social Responsiveness Scale – Second Edition (SRS-2) foi utilizado para o rastreio do TEA. Ao compararmos a associação entre o risco para crianças que foram expostas ao ZIKV na gestação, observamos que o percentual de risco nas crianças expostas (33/179, 18,4%) foi semelhante ao do grupo não exposto (17/92, 18,5%). Entretanto, dentre estes, todos os participantes classificados no nível grave do TEA (12,1%) pertenciam ao grupo exposto, comparado ao grupo não exposto. Em relação às características sociodemográficas e biológicas, observamos que a renda per capita inferior a meio salário mínimo foi significativamente mais frequente no grupo exposto (18/179, 11,8%) em comparação ao grupo não exposto (2/92, 2,4%). Na avaliação do desempenho cognitivo por meio da Wechsler Intelligence Scale for Children (WISC IV), observou-se que 13,3% das crianças do grupo exposto apresentaram quociente de inteligência total classificado como extremamente baixo/limítrofe, em comparação a 5,6% das crianças do grupo não exposto. Identificamos também maior frequência de desempenho cognitivo extremamente baixo/limítrofe, comparando as crianças com risco e sem risco para TEA (34,1% e 5,4%, respectivamente). Portanto, o presente estudo amplia os conhecimentos acerca do TEA e mostra que crianças expostas ao vírus Zika durante a gestação, mesmo na ausência do fenótipo da SZC, podem apresentar, com maior frequência, sinais de risco para o Transtorno do Espectro Autista em nível grave, reforçando a importância da atenção e do acompanhamento contínuo dessa população.