A PEDAGOGIA CORPOVIVENCIAL DOS ORIXÁS: sabedoria e ancestralidade a partir da Tradição do Candomblé Ketu-nagô no Ilê Axé Xangô Airà em Caruaru-PE
Pedagogia Corpovivencial dos Orixás. Candomblé Ketu-nagô. Ilê Axé Xangô
Airà. Sabedoria. Ancestralidade.
O presente projeto de tese consiste numa investigação em andamento que tem como objetivo
refletir sobre uma experiência educativa não escolar por meio de uma pesquisa sobre a relação
entre corpo e Candomblé que abre a possibilidade criativa de uma pedagogia advinda da
presença incorporada e cósmica dos Orixás na tradição do Candomblé Ketu-nagô – a
pedagogia corpovivencial dos Orixás –, tendo como campo empírico o terreiro do Ilê Axé
Xangô Airà em Caruaru-PE. A questão-problema que orienta nosso itinerário epistêmico é a
seguinte: Como se dá a transmissão da sabedoria e a vivência da tradição do Candomblé – em
particular através do cotidiano e da preparação e partilha da comida de santo – no Ilê Axé
Xangô Airá em Caruaru-PE, através de uma pedagogia corpovivencial dos Orixás? Nosso
objetivo geral é compreender como se dá a transmissão da sabedoria e a vivência da tradição
do Candomblé – em particular através do cotidiano e da preparação e partilha da comida de
santo – no Ilê Axé Xangô Airá em Caruaru-PE através de uma pedagogia corpovivencial dos
Orixás. Nesta esteira indagativa, procuramos realizar um diálogo teórico, epistêmico, ético e
espiritual a partir da noção de pedagogia corpovivencial e das categorias da sabedoria e
ancestralidade. A pedagogia corpovivencial consiste em ensinagens e aprendizagens que se
dão no e a partir do corpo, sentidas, transmitidas e compreendidas em uma racionalidade
corporificada, assente nos sentidos, na percepção e na cognição, em relações interpessoais que
criam incorporações de saberes e práticas. No contexto de nossa pesquisa, como uma
pedagogia corpovivencial dos Orixás, ela é marcada pela presença de uma experiência
fortemente significativa e simbólica, formada e tecida a partir da presença do sagrado, dos
Orixás, pela presença de um corpo cósmico que cria pedagogias através de suas vivências,
demonstrando uma dinâmica viva no cotidiano e nas práticas das comidas de santo. Está
assentada no corpo e é sustentada e expandida pela e na união entre cognição, intuição e
vivências, fazendo uma costura teórico-epistêmica entre viver e saber, em uma proposta
pedagógica de aprendizagem espiritual, cognitiva e vivencial, ao mesmo tempo filosófica e
prática; demonstrando uma união vivencial entre fazer e conhecer, que é o saber. Nesta
esteira, buscamos traçar caminhos iniciais dentro dos objetivos específicos do projeto, que
são: evidenciar as cosmopercepções centrais da tradição do Candomblé, tendo como
centralidade a sabedoria e a ancestralidade; conhecer a noção de pedagogia corpovivencial
que emerge na transmissão da sabedoria e na vivência da ancestralidade no cotidiano e na
preparação e partilha da comida de santo; e analisar as práticas ensinantes e aprendentes do Ilê
Axê Xangô Airà em Caruaru-PE na percepção de uma pedagogia corpovivencial dos Orixás.
Para tanto, percorremos um trajeto teórico-metodológico a partir das filosofias,
epistemologias e pedagogias afro-brasileiras, africanas, afrodiaspóricas e do Candomblé Ketu-
nagô – e seus fundamentos, através dos aportes de Muniz Sodré (1997; 1998; 2002; 2017);
Luiz Rufino (2019; 2021; 2023); Luiz Antonio Simas e Luiz Rufino (2018); Nei Lopes e Luiz
Antonio Simas (2020); Juana Elbein dos Santos (2012); Oyèrónkẹ Oyěwùmí (2021); Achille
Mbembe (2018; 2019; 2022a; 2022b); Renato Noguera (2014; 2020; 2022); Leda Maria
Martins (2021a; 2021b); Sidnei Nogueira (2020); Antônio Bispo dos Santos (Nêgo Bispo)
(2015; 2023); Hampaté Amadou Bâ (2010); Odera Oruka (1994; 2002), entre outros (as); bem
como pelo pensamento decolonial abordado por Aníbal Quijano (2005); Frantz Fanon (2020;
2021; 2022); Grada Kilomba (2019); Nelson Maldonado-Torres (2008), entre outros (as);
caminhamos também com os estudos sobre o cotidiano e as pesquisas nos/dos/com os
cotidianos através dos aportes de Alder Júlio Calado (1998; 2000); Nilda Alves (2001; 2008);
Nívea Andrade, Alessandra Nunes Caldas e Nilda Alves (2019); Carlos Eduardo Ferraço
(2007) e Stela Guedes Caputo (2018). Metodologicamente, pretendemos fazer uso da abordagem qualitativa, tendo como esteio o método biográfico/autobiográfico, conforme
tecido por Maria Helena Menna Barreto Abrahão (2003) e Leonor Arfuch (2010). Para a
coleta dos dados, elegemos as técnicas da observação participante inspiradas em Maria
Cecília Minayo (2012) e outros, além do diário de campo, conforme Allene Lage (2005;
2013) e da realização de entrevistas semiestruturadas com os sujeitos. Para a análise dos
dados, pretendemos servir-nos da análise de conteúdo, com recorte temático, em Laurence
Bardin (1977). Como considerações parciais da investigação, percebemos que o corpo pode
ser presença ensinante-aprendente de ancestralidade e sabedoria, atuando como aprendizado
manifesto, encarnado, já que, na pedagogia corpovivencial dos Orixás, as vivências de
transmissão de sabedoria/axé – e as aprendizagens advindas daí – se dão na relação
interpessoal e comunitária que tem o corpo como dimensão fundante, central. Com esta
compreensão, temos como hipótese delineadora de caminhos de pesquisa que as dimensões
centrais de ensinagens e aprendizagens do Candomblé Ketu-nagô na percepção de uma
pedagogia corpovivencial dos Orixás se dão, especialmente, no cotidiano, tendo como uma de
suas vivências e dimensões a preparação e partilha da comida de santo.