Quem tem medo de ser cancelado? Mobilizações e conflitos nas mídias sociais digitais
Cancelamento; Mídias sociais digitais; Etnografia digital; Plataformização; Disputas políticas
Esta dissertação analisa as mobilizações e os conflitos acerca do “cancelamento” nas mídias sociais digitais, investigando
as disputas conceituais e os repertórios de ação desencadeados nos episódios de cancelamento explorados. A partir da etnografia de
quatro episódios de cancelamento envolvendo figuras públicas de diferentes espectros políticos — Lilia Schwarcz, Djamila Ribeiro,
Maurício Souza e Sikêra Júnior —, a pesquisa investiga os processos de acusação e reivindicação de direitos presentes nos casos,
bem como as relações de poder que atravessam as narrativas dispostas e acabam sendo acionadas, inclusive, para legitimar ou
contestar as práticas nomeadas enquanto “cancelamento”. Nesse sentido, o estudo dialoga com a literatura socioantropológica que
versa sobre a relação entre mobilização sociopolítica on e offline, ao buscar compreender as imbricações entre engajamento,
viralização e disputa por legitimidade. Por esse caminho, a presente etnografia revela que o cancelamento opera através de uma
linguagem comum de direitos, sendo apropriado e ressignificado por distintos grupos que se inserem em pelo menos dois campos
discursivos de ação, os quais fomentam os sentidos dos cancelamentos: aquele que concebe o cancelamento enquanto prática de
acusação, julgamento e punição injusta, autoritária e indevida, e aquele que concebe o cancelamento enquanto estratégia de
reivindicação de direitos, denúncia de violências, opressões e injustiças em favor do reconhecimento de grupos minorizados. Além
disso, esta dissertação discute de que forma, e em que medida, a infraestrutura digital, através das plataformas digitais
algoritmizadas, influencia os cancelamentos ao trazer impacto tanto em sua disseminação quanto em suas consequências. Sendo
assim, a presente etnografia aponta para a complexidade das dinâmicas de cancelamento que acabam revelando disputas sobre
moralidade, reconhecimento e poder nas redes, de forma a desafiar e reproduzir ordens sociais e políticas. Dessa forma, a pesquisa
contribui para a compreensão das novas formas de mobilização sociopolítica na era digital, destacando as tensões e os conflitos
existentes entre democratização da informação e plataformização das dinâmicas sociais.